sexta-feira, março 12, 2004
terça-feira, março 09, 2004
Um trechinho de estória da nossa campanha de Ars Magica, Vértigo, mestrada pelo caríssimo R. Balbi. Ele mesmo fez alguns retratos de personagens da campanha no fotolog, inclusive um da ana, aki.* * * Matilde deixou o aposento a passos apertados, quase fugindo. Não por Philippo; era raro, sim, vê-lo com a cara fechada daquela maneira, mas havia acontecido antes, não era tão inusitado, nem mesmo tão ameaçador. O mais espantoso foi o modo como Ana tinha imediatamente parado de falar, e permanecido calada, tão logo ele abriu a porta – e era preciso muito pouco tempo com Ana para entender que isto era de uma raridade absurda. A porta fechou, e Matilde rumou de volta para a cozinha sem ousar pensar num motivo para o silêncio, ou para os olhares de ambos.
Philippo fez menção de sentar-se na cama antes de rapidamente recolher o movimento e dirigir-se à cadeira. Ana puxou os lençóis e espremeu-se contra a parede, como se isso aumentasse a distância entre ambos.
- Você está melhor. Já está quase completamente curada. – afirmou ele, no galego cada dia mais fluente, a tônica piemontesa de suas sílabas beirando à extinção. Fosse outra pessoa, pensava Ana, ele talvez tivesse perguntado (“está melhor?”); ou mesmo mostrasse alegria (“você já está quase completamente curada!”); e a irritação causada por este pensamento estampou-se claramente em seu rosto. Ele uniu os dedos das mãos em reação, como fazia sempre que não estava à vontade com algo – um cacoete que mostrava desde seus tempos com a velha trupe. – Deves agradecer àquela mulher, Jalila. Suas habilidades são realmente prodigiosas.
- É. – ela respondeu.
- O modo como ela tratou o ferimento no seu rosto foi excepcional, quase não se vê mais a ferida.
- Sim.
- E as queimaduras nos pulsos, as escoriações.
- Hmhm.
- E aquele corte no seu braço, como está? Não o vejo daqui.
Ela estendeu o braço direito para fora da coberta, mostrando o talho na altura do antebraço. Ele levantou-se bruscamente da cadeira em sua direção, soltando as mãos, como se a situação finalmente lhe desse um direito à intimidade. Mas não tocou no ferimento.
- Criança. – ele levantou o olhar para Ana. – O que aconteceu contigo?
Ela recolheu o braço em resposta.
Ele a princípio cerrou a testa como se fosse gritar, depois segurou o colchão bem apertado com os dedos, e finalmente voltou a unir as duas mãos, levantando-se da cama e caminhando até a parede oposta.
- Você continua indisposta a me dizer. Por quê?
Ela permanecia muda.
- Eu tenho tolerado essa atitude há mais de um mês, desde que chegaste aqui à beira de morte. Cuidei de ti sem questionar, como sempre. Não mereço um mínimo de consideração?
- Claro que merece, tio.
- Eu não sempre confiei em ti, e tu em mim?
- É, tio.
- Então porque não me contas quem te fez isso? Como fizeram? Onde estiveste?
Não conseguia encontrar palavras. Na verdade ela provavelmente teria dito tudo sem pestanejar, mas não sabia como, nem saberia justificar, explicar; adoraria poder compartilhar tudo que passara com Philippo, a dor, o desespero, o arrependimento; adoraria pedir sua ajudar para retornar com ele à vila e salvar João, vingar-se daquele populacho nojento – se achasse as palavras. Se achasse que ele estava disposto a compreender e ajudar.
- Não dizes. Nem este pingo de consideração. Então mudo a pergunta: porque deixaste El Ferrol? Tu não estavas bem instalada lá, com teus companheiros?
- Estava ótima, tio.
- Não tinhas um teto, cama, o melhor da comida e da bebida? Não tinhas a chance de viver da arte com tranqüilidade?
- Tinha.
- Então! – Philippo estendeu os braços teatralmente. Outro velho cacoete.
- Eu agradeço, tio. Não foi por mal ao senhor.
- Não? Que ótimo. – juntou os dedos novamente, irônico. – Mas senão, por que foi, então?
Ana desviou o olhar e calou-se novamente. Philippo, como quem já esperava a reação, retornou à cadeira.
- É estranho – acomodou-se ele, em falsa calma. – que te cales ao conversar comigo, que te conheço há tantos anos, e dignes-te a jogar conversa fora com estranhos como Matilde. Ou com aquele vagabundo do Moritias.
Ele quase sorriu de satisfação ao perceber como Ana rapidamente voltou a encará-lo, e ela até chegou a puxar o fôlego para retrucar – mas súbito, percebeu que era o que ele queria, ou ao menos esperava, e não fez mais nada.
- Ora. – prosseguiu Philippo. – Não vais dizer nada em defesa dele? Imaginei que o tivesse em alta conta, vendo como são freqüentes suas visitas aqui. Afinal, de que conversam todo este tempo?
Sabia, pensava ela, sabia que ele chegaria a isto. Mas não daria essa satisfação a ele. Não podia deixar que ele cruzasse essa barreira, o basta tinha que vir agora. Ela esforçou-se, pensando desesperadamente em alguma maneira de colocar um ponto final naquilo sem soar tremendamente rude, mas por fim o silêncio do aposento atingiu o máximo de sua extensão, e ela preferiu dizer qualquer coisa antes que ele voltasse a fazê-lo antes:
- Sinceramente, tio... Não é da sua conta.
- Não é da minha!!? – Philippo saltou da cadeira, interrompendo-se, apertando o pano de sua roupa até quase rasgá-la, os lábios contorcendo-se no esforço de conter as palavras. Então levou a mão direita à frente, num gesto parcialmente acusador, antes de prosseguir sem conseguir disfarçar a raiva. – Como você pode dizer isso? A mim? Como? Eu te tirei da rua, te dei abrigo, segurança, comida, te dei até meu sobrenome! Eu tolerei cada pequena rebeldia e instinto aventureiro teu! Eu tolerei que vagasses por onde bem entendesses, porque confiava em ti! E como posso confiar agora?
- Eu não fiz nada de errado. – ela já não se encolhia mais contra a parede.
- Não? E que nada é esse que te fere até quase a morte? Hein? Não dizes?
- Não. – engoliu em seco. Era tão difícil responder a ele assim.
- Sua ingrata. Tu não tens o direito –
- Tenho sim!
O grito dela interrompeu Philippo de uma maneira tão imprevisível, que ambos pausaram, surpresos. Foi por uma sorte que Ana conseguiu retomar o diálogo primeiro:
- É minha vida, tio. Quem mais pode vivê-la? Quero dizer, ninguém. Eu não quero, tio, entende? Sou grata a ti! Mas se é para ficar a vida toda presa àquela corte ridícula de El Ferrol, não sei dos perigos do resto do mundo. Mas viver presa assim? Prefiro morrer!
Philippo passou a mão sobre os olhos, suspirando.
- És uma idiota, como tua tia.
- Tia Ana não era –
- Uma idiota, sim, era exatamente isso que ela era. Que achas que ela me disse da última vez que a vi? Que preferia morrer! Pois bem, a preferes assim, morta? Hã?
- Mas, mas não foi culpa dela.
- Ah, não? De quem então? Minha?
- Não!
- De quem, então?
- De.
- Sim?
Ela encolheu-se de novo na parede, e calou-se.
- De quem foi a culpa, Ana? De quem? Ias a dizer algum nome?
- Não, tio.
- Não ias. Escuta bem uma coisa sobre tua tia. Ela viveu irresponsavelmente como tu fazes hoje em dia; bem sabes que ela preferia apanhar a dar satisfação a alguém. Era uma idiota, como eu disse. Amei-a desesperadamente, mas sempre soube que era uma idiota.
- Tio!
- Cala-te. Tens que aprender uma coisa comigo e com tua tia morta, Ana. Aprende como eu aprendi a duro custo, por mais que meu mestre tanto insistisse em ensinar. O risco é para os tolos; esta ânsia de liberdade que nos consome na juventude, uma miragem que deixei que me enganasse. Só é possível viver sem dar satisfações quando se é responsável, se calcula, se planeja com cuidado. É duro, quando se é jovem, mas com o tempo, acostuma-se a isso.
- Mas.
- Sem “mas”. Não te obrigo a mais nada. Talvez tenhas razão em dizer que tua vida não é mais da minha conta; mas acredita mais ainda em mim quando digo que deves aprender a ser responsável. Teus atos claramente tiveram conseqüências para ti, não sei se para outros. Tens que remediá-las, aprender a lidar com elas.
- ... sim. – Ana abaixou a cabeça, pensando em João Ligeiro, no que ele devia estar passando por tê-la ajudado a fugir.
- Queres viver descompromissada? Ótimo, corres o risco de acabar como tua tia, mas não te impeço mais. Agora, se queres meu conselho, tenta voltar à El Ferrol. A estabilidade que te caberá lá não tem preço; com sorte, podes até arranjar alguém, talvez não um nobre, mas alguém que te apeteça e sustente tuas ocasionais aventuras. Quem sabe? A chance de fazer família também não tem preço, e acho que posso dizê-lo, já que perdi a minha.
Philippo abaixou a cabeça sem perceber, e seus olhos pareceram observar através do chão, como se não estivesse lá. Ana saiu da cama, esticou os braços para abraçá-lo.
- Desculpa, tio. Não queria ficar te remoendo essas coisas.
- Não, não é problema. Preocupo-me só contigo. Ficas aqui por enquanto?
- Não, acho que não. Eu vou. Não sei, vou ver o que faço, talvez volte à El Ferrol. Tenho saudades da trupe, e de Elisa. Coitada.
- Elisa? A dançarina?
- Ela. Ah, tio, o que aquele Conde filho da puta faz a ela!
- ANA!
- Desculpa, tio, não sei o que me deu. Se eu pudesse, pegava aquele desgraçado e... mas bem, não posso. Só que há algo a fazer antes de ir lá, e. Hm. Não sei. Algumas pessoas que posso chamar.
- Vê lá onde te metes. – levantou-se, afastando-a carinhosamente. – Outra coisa. Não esperes muito de Moritias; ele é assim com todas e tantas. É incapaz de dedicar-se a alguém. Imagino que tu queiras algo diferente.
- Acho, acho que. Bom, sim.
Ele rumou para a porta, com os braços soltos.
- Muito bem. Vou voltar a cuidar de minhas coisas, qualquer coisa peça para me chamarem.
- Claro.
- Sabes que tudo que faço é pro teu bem, não sabes?
Ela mordeu o lábio.
- Sabe, tio? Pareces até Giuseppe, falando assim.
- Giuseppe? – estranhou Philippo. – Quem? Giuseppe meu mestre?
- Ele.
- E é ruim isso?
- Não! Não, de jeito nenhum...
- Ora. Bem, até breve.
Philippo fechou a porta, meio bruscamente, e ela completou à meia-voz.
- ... afora o hábito dele de matar só pra provar que está certo, acho que problema nenhum...
posted by Heitor 10:55 PM
Visitando o blog do miurráuse, q está com problemas de template, me lembrei de esclarecer: já era pra ter mudado este aki há muito tempo. Pelos menos no tema. É q ainda naum resolvi meus problemas de hospedagem com o terra; assim q o fizer, troco esta merda; e aproveito para acrescentar alguns links q ando devendo...
posted by Heitor 3:06 AM
Atualizei o Carrasco de Órion hj, após bastante tempo - como eu infelizmente já esperava. O post tbm acabou ficando na metade do q eu pensei em fazer, a princípio, mas levando-se em conta o meu sono, se eu conseguir engatilhar a sequência logo vai ter valido a pena.
posted by Heitor 2:41 AM
Atualizado quando eu quero e foda-se!
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Bem-vindos! O blog mudou de hospedeiro, mudou de cara, largando aquela coisa de template temático, mas continua a mesma parada tosca.
BONILHA BLOG não é um projeto, não é uma experiência, é apenas um lugar onde posso escrever publicamente o que quer que ache interessante, para quem quer que ache interessante poder ler.
QUEM É VOCÊ?
Heitor Coelho, na casa dos vinte, atualmente no limbo entre bacharelado e advocacia, magalômano, ponto focal de convergência de interesses esdrúxulos, frequentemente confundido com Hector Bonilla, acredita em dialética, astrologia e robôs gigantes.
Se você tem algum comentário sobre esse blog, ou encontrou algum erro, link defeituoso, etc., por favor mande-me um mail
BREVE:
Xenosaga: Episode 2! Haradrynn! Tao 2! E mais referências pseudo-intelectuais do que você poderia contar nos dedos!
CONTOS DO BONILHA!
PS: Parei com aquela porcaria de legenda, aquilo dava muito trabalho...
CONTOS:
"APRENDIZ DE FEITICEIRO"- este é dos velhos. Magos infestam um futuro apocalíptico(q, aliás, já passou;-)).
"O ARNALDO É LOUCO" - crônica escolar, sobre meu antigo professor de matemática.
"OS DIAS NEGROS DE KRYNN" - ainda mais velho, meu primeiríssimo. D&D puro, se vc num gosta, fique longe.
"DEZ REALIDADES" - coletânea de dez pequenos contos ligeiramente interligados.
"DESCRENÇA EM 6° CÍRCULO" - menos D&D q Dias Negros, mas muito maior. Velhos companheiros de aventura reencontram-se, agora como inimigos.
"É, MAURÍCIO..." - o trágico fim de Maurício Razi?
"A TERRA DA DEUSA FURIOSA" - uma expedição rumo ao desconhecido e um final inusitado.
"NÉVOA PRATEADA" - a sequência de "Aprendiz de Feiticeiro".
"MOLHADO" - um assento de Ônibus molhado e muita realidade consensual.
"MATRIZ" - pequena sequência de estórias passando-se na Casa da Matriz, aki no Rio.(antes q vc pergunte, com personagens fictícios)
"RANDÔMICOS" - a origem de Gericault, andarilho dos olhos prateados, e um breve debate sobre Destino, Acaso e Morte.
"KÉRAMUS E O POTE DE VENTO" - a história do mago mais poderoso de Heshna, e de como ele consegiu encher um pote com vento.
"JUSTIÇA" - conto policial com Shade, um detetive levemente amargo.
"MUUNAITE III, DE PARTI" - 2 amigas batem um papinho na festa mais boyplay da cidade.
"TAO, O NOME" - conheça TAO, o maior jogador de videogame de todos os tempos.
"O SONHO DE TAKASHI" - o primeiro conto lodista! Pode Takashi lembrar-se de seu sonho e sua idéia ao mesmo tempo?
"PISANDRO" - um professor de História relembra sua juventude, seu amor perdido, e suas desavenças com Deus e o Destino.
"O EVANGELHO SEGUNDO K. C." - dois senhores discutem música e religião num futuro próximo. Bom, não tanto.
"NADA DEMAIS" - Nada demais mesmo. Juro.
"TAO - POR QUE LUTAR" - Tao, o rei dos games, revela algo do seu passado, e de como começou a jogar sério.
"BRINQUEDOS" - Os brinquedos de Joãozinho eram especiais: podiam falar e até mesmo brincar sozinhos! Ou será que eles estavam trabalhando?