segunda-feira, julho 05, 2004

 
GRUDENTO

Sou terrivelmente lento pra dormir, como sou pra acordar e, a bem dizer, pra tudo. Adquiri o hábito, talvez a doença, de ficar extremamente ativo nos períodos imediatamente após a meia-noite, e o sono q tinha vindo com força por volta das 3 da tarde, 7 da noite ou pouco antes das 11 some. Pra recuperá-lo, a metodologia mais frequente é uma longa caminhada meditativa pela cozinha - qquer outra coisa, computador, tv, música, via de regra só me acorda mais. Fico nisso até meus pés reclamarem, então rumo pra cama e, ao estacionar lá, percebo q finalmente estou tonto de sono e capoto. Costuma funcionar - mas ontem, por exemplo, não funcionou muito bem, e levei coisa de 3 horas pra achar meu sono.

Vc talvez imagina q odeio isso, mas a bem da verdade não odeio, não. Óbvio q há desvantagens, e as olheiras estão aí pra confirmar; ainda assim sou muito grato pelas minhas vastas divagações noturnas, pelas fantasias, pelas ponderações e pelas criações. De ontem pra hoje, por exemplo, gastei aí algumas horas categorizando sonhos, o q achei altamente divertido e inspirador.

É, eu sei q sonhos, a bem da verdade, não se podem categorizar de maneira totalmente funcional, como aliás tudo mais; mas ao mesmo tempo, imagino q muita gente concordaria q há sonhos... e sonhos.

Por exemplo, o tipo de sonho principal, o mais frequente, é o sonho esquecido. Este tem duas formas. Uma é akela de quem diz que nunca sonha, ou quase nunca; gente q talvez num nível superficial até acredite q simplesmente fechou os olhos, abriu de novo, e nada aconteceu a ele no intervalo de muitas horas q separou uma coisa da outra - no fundo, no fundo, porém, mesmo estes sabem q estão mentindo. E sabem principalmente por causa do segundo tipo de sonho esquecido, q é o q chega a por os pés na realidade contigo, mas aos poucos vai fugindo, sumindo, como se corresse de medo dela - ou como se ela e vc corressem de medo dele. Vc talvez consiga tempo de escrevê-lo ou contá-lo a alguém, e isto talvez preserve sua memória e o transforme em outro tipo de sonho; de todo rumo, na verdade a maior parte dos sonhos é assim, e mesmo qdo vc se lembra deles, guarda apenas algumas cenas, fragmentos mais marcantes, e sabe q horas e mais horas de detalhes deles foram enterradas no subconsciente, junto com as outras lembranças reprimidas q ao longo de sua vida o farão pensar, agir e sentir de maneira quase absolutamente incompreensível.

Dos q escapam ao eskecimento, muitos o fazem por serem o tipo de sonho q pode se chamar de simples. Sei bem q não há sonho inteiramente simples, mas há sonhos q podem ser olhados com um enfoque simples, e atribuídos a um motivo simples, além dos prováveis motivos complexos, sem q nem um nem outro sejam falsos. Podem ser tbm chamados de fantasiosos, pq sua premissa básica é realizar em sonho algum desejo, q pode ou não ser realizável no mundo desperto. Pode ser um desejo realmente fantástico, como ser um super-herói, pilotar um robô gigante, viver num país de chocolate; ou algo mais palpável, como um prato de filé, um emprego, sexo, ou uma partida de double dragon com seu falecido pai. É desse tipo de sonho q surge a expressão "seguir seus sonhos", q costuma não passar de um eufemismo para "faça o q deseja".

A maioria dos sonhos fantásticos parece, com muita frequência, e de alguma forma, menos real do q os demais, o q nos leva a outra divisão de tipo de sonho: os sonhos surreais, e os realistas. É uma designação propositadamente absurda para ambos - sonhos são todos surreais e realistas, pois todos sem exceção parecem reais sem sê-lo, ao menos em relação ao q normalmente se designa realidade, isto é, nossa vida desperta. Mas alguns são mais uma coisa q outros: há sonhos em q vc perde totalmente a consciência de q está sonhando, eskece mesmo de q tem outra vida além dakela te esperando, estes via de regra são um pouco menos fantasiosos; e há akeles em q vc tem tanta noção de q sonha, q chega a alterar as regras do sonho e a controlar a brincadeira toda, o clima, o cenário, os outros participantes. Por vezes, transita-se de um tipo ao outro - algum elemento fantasioso te traz a consciência de q é um sonho, e esta percepção por sua vez te dá a capacidade de alterá-lo mais livremente, ao custo de boa parte da credibilidade e do impacto q ele tem sobre vc.

E é impacto, de curto ou longo prazo, o ingrediente principal do tipo de sonho seguinte: o sonho assustador. Vc talvez o conheça como pesadelo, e tenha ouvido q ele é o oposto dos sonhos, o q só é verdade na mesma medida em q se diz q demônios são o oposto de anjos... no fundo, no fundo, farinha do mesmo saco. Categorizar sonho como oposto ao pesadelo é dizer q todo sonho é desejo e todo pesadelo, medo - uma categorização tão falha qto todas as demais aki, só q muito mais chata; até pq no fim das contas quase tudo q mais desejamos é, tbm, o q mais tememos. Por isso o sonho assustador nem sempre é o pesadelo típico - o monstro, a queda, seus colegas rindo de vc, etc.; eu por exemplo não me lembro da última vez q tive um sonho assim. Muito mais assustadores são os q não o parecem ser a primeira vista. Estão para os pesadelos simples como Hitchcock para Pânico: não dão sustinho; lenta e inexoravelmente vão se fechando sobre vc e destrinchando seus podres. Dizem q o sonho eskecido sofreu uma censura do seu consciente. Se é assim, o sonho realmente assustador é o q escapou por um fio do eskecimento: ele é algo tão bizarro, tão inaceitável, q o próprio fato de sua mente não tê-lo riscado do mapa só te faz perceber o qto sua cabeça já está aceitando akilo, tornando-o mais aterrador ainda. E se o sonho em q coisas terríveis acontecem contigo assustam, muito piores são os sonhos onde vc faz coisas terríveis com outros - estes sim mostram a coisa mais assustadora do mundo: vc mesmo.

Tipos de sonhos, está na cara, não são mutuamente excludentes. Desejos realizados podem ser eskecidos, sonhos fantasiosos podem ser realistas, pesadelos podem ser surreais. Mas há um tipo de sonho q transcende a todas estas categorias: o sonho grudento.

Não deixe o nome te enganar, o sonho grudento é o mais assustador, o mais fantasioso, o mais realista, mesmo q não seja nenhum deles. Ele desafia a própria natureza dos sonhos, pq ao contrário dos sonhos eskecidos, ele não foge da realidade nem ela dele - vc o conhece muito bem, pq o sonho grudento, qdo quer q ele tenha sido sonhado, nunca mais te largou, embora vc talvez tenha pensado q ia se livrar dele. Ele te perseguiu até o mundo desperto, e com certeza ficou ricocheteando pela sua cabeça durante um ou mais dias. Ele não precisa q vc conte-o a alguém ou escreva-o para ser lembrado; na verdade vc demorou muito para se convencer de q ele era um sonho, e quase seguiu agindo como se todos os eventos dele tivessem mesmo acontecido. Nada disso quer dizer q os eventos do sonho grudento sejam minimamente verossímeis ou desejáveis, muito embora possam ser: a realidade do sonho grudento não está em nada disso, e sim na inexplicável sensação de verdade q ele transmite. Nele vc amou de verdade, temeu de verdade, conquistou e perdeu de verdade. Mas ele tbm não precisa fazer nenhuma gde revelação a seu respeito para transmitir verdade, e o fato de não ser soterrado no subconsciente não quer dizer em hipótese nenhuma q ele não vai te fazer pensar, sentir e agir de formas totalmente inexplicáveis - vc provavelmente já fez isso no próprio sonho, ainda q nem isso seja um pré-requisito.

Pq o sonho grudento é o sonho por excelência e, como tal, transcende tbm qquer explicação plausível e categorização (inclusive a de sonho grudento). E a única coisa q todos os sonhos grudentos têm em comum é q cada um deles tem um gostinho todo próprio, q vai permeando sua vida normal e deixando tudo com cara de sonho, o q veio a se chamar de sonhar acordado, de uma maneira q somente as melhores obras de arte e momentos memoráveis de nossas vidas conseguem chegar perto de imitar - precisamente de onde surge a questão q, com certeza, um sonho grudento despertou uma ou outra vez na sua vida, tirando-lhe todo o sono como consequência: onde estão, afinal, o original e a imitação? Onde foi q vc temeu, amou, conquistou e perdeu de verdade? No sonho?

Ou na cozinha, zanzando de um lado pro outro atrás do sono perdido, divagando em categorizações de sonhos pra tentar eskecer, em vão, de um certo sonho grudento q permeou seu dia, e q vc não só pensou e acreditou, mas desejou com tudo q te forma, q fosse mais real q ele?
posted by Heitor 8:59 PM

Bem-vindos! O blog mudou de hospedeiro, mudou de cara, largando aquela coisa de template temático, mas continua a mesma parada tosca.

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"OS DIAS NEGROS DE KRYNN" - ainda mais velho, meu primeiríssimo. D&D puro, se vc num gosta, fique longe.

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"DESCRENÇA EM 6° CÍRCULO" - menos D&D q Dias Negros, mas muito maior. Velhos companheiros de aventura reencontram-se, agora como inimigos.

"É, MAURÍCIO..." - o trágico fim de Maurício Razi?

"A TERRA DA DEUSA FURIOSA" - uma expedição rumo ao desconhecido e um final inusitado.

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"O SONHO DE TAKASHI" - o primeiro conto lodista! Pode Takashi lembrar-se de seu sonho e sua idéia ao mesmo tempo?

"PISANDRO" - um professor de História relembra sua juventude, seu amor perdido, e suas desavenças com Deus e o Destino.

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